quarta-feira, 5 de junho de 2013

Nuno Crato quer escolas a escolher professores com base no mérito

Alguns comentários que se me oferecem:

1 - Nuno Crato tem, para a educação, um programa libertário. O que significa que a quer transformar radicalmente, de direito fundamental e serviço público, em «mercado de ensino»: vende-se o 'produto' ao cliente com capacidade para o comprar. A sua sorridente utopia do Estado mínimo não comporta serviços de natureza socioeducativa, como não comporta nenhum dos que caracterizam a evolução civilizacional associada ao Estado Providência nem à sociedade de Bem-estar.
 
2 - A mercantilização do ensino é o verdadeiro conteúdo da visão radical da Autonomia, sendo, neste caso, um mero eufemismo para a concorrência desregulada e selvagem. Por isso, defender a livre-escolha da escola por parte das famílias, que é a versão mercantil na perspetiva do cliente, encontra-se em perfeita coerência com a mercantilização das «empresas escolares» e dos seus administradores de topo (diretores?), o que Crato designa de «escolha baseada no mérito».
 
3 - Entretanto, o libertarismo educativo (e não só) não passa de uma irreal utopia (quando descrita em termos teóricos), que não resiste ao confronto da realidade. Se o mérito profissional dos docentes pudesse ser objetivamente definido, quer em termos de produto, quer em termos de processo; se o mérito profissional dos docentes fosse passível de ser quantificado e medido de forma imparcial; se pudéssemos encontrar uma entidade reguladora, garante da dita imparcialidade; se dessa identificação rigorosa derivasse a integração no mercado de trabalho e até o índice de remuneração ... Se assim fosse ou pudesse, a curto prazo, ser, então estaríamos todos de acordo.
 
4 - Mas a realidade é muito menos simples. A escola é uma organização complexa onde confluem diversos níveis políticos: macro, mezzo, micro.
A micropolítica da escola inclui complexas redes de poder e influência onde o mérito não tem direito de cidadania. Tem-no os grupos de pressão, os variadíssimos 'amiguismos', os rumores, os conflitos ...
Há diretores(as) particularmente vulneráveis a estes «fluxos» ambientais. A esses, falta-lhes o «mérito» da liderança segura, construtiva e serena - aliás, que nem há outra.
 
5 - O senhor ministro Crato deveria fazer um estágio (alargado) em algumas escolas secundárias. Só então, lhe reconheceríamos o mérito de aplicar a sua cega agenda neoliberal.




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