sexta-feira, 29 de março de 2013

A honra de Crato

Nuno Crato «guarda» relatório sobre a licenciatura do Ministro Relvas, há dois meses, noticia o Expresso de hoje (pág. 8).

Que aspetos deixam dúvidas orgânicas na licenciatura de Relvas, obtida através de equivalências, correspondentes a 160 créditos (quando uma licenciatura completa tem cerca de 180 créditos)? Várias: nenhum outro aluno da Universidade Lusófona obteve tão elevado número de créditos por equivalências; foram dadas equivalências a cadeiras que não existiam, à data, no plano do curso; faltam comprovativos das notas atribuídas; há notas assinadas por outrem (o Reitor), e não pelo docente da cadeira… Enfim, basta para que a tutela tenha o dever de exigir esclarecimentos.
Porém, quando o MEC é Nuno Crato, esse dever é, além de funcional, um dever moral, de honra. E isto porque Crato, depois de uma breve passagem pelo Ensino Secundário (dois anos, de 1980 a 1982) como docente, depois de se ter tornado professor do Ensino Superior e de ter lido umas coisas sobre educação, que encaixou na sua versão elitista e salazarenta do saber, se promoveu numa carreira de comentador e político, que assumiu como bandeira a luta contra o facilitismo.
Foi através desse discurso balofo, no seio do qual deixou sempre por definir, com mínimo rigor que fosse, conceitos fundamentais com os quais operava – como o de facilitismo – que se impôs num discurso populista que agradou a muitos docentes, uns por pura ingenuidade, outros por nostalgia da régua e do medo como armas de imposição social, outros por ‘tique’ de classe real ou fictícia. São esses os que hoje se sentem defraudados com o seu Ministério. O que não é o meu caso que, correndo quase riscos de ‘linchamento’, e comparando Crato com Maria de Lurdes Rodrigues, defendi sempre que tínhamos, agora sim, entrado na situação de catástrofe.
Foi em nome da luta contra o facilitismo que Crato, mal chegado ao Governo, elegeu como máxima perversão do sistema, o programa de certificação e validação de competências dos CNO e iniciou o seu extermínio.
Foi em nome da luta contra o facilitismo que Crato, depois, aboliu disciplinas do Ensino Básico e reduziu carga horária a disciplinas do Ensino Secundário: as associadas ao ensino artístico, à educação para a cidadania, às humanidades  e outras ‘inutilidades’ que vão para além do ler, escrever e contar e do culto dos exames como regra única de medida de conhecimentos. Assim mesmo, em sentido restrito, restringindo a educação. Quantitativa e qualitativamente.
Foi também em nome desta ideologia falsamente meritocrática, contábil e empobrecedora, que Crato desvalorizou os resultados do relatório da OCDE, que demonstravam as significativas melhorias dos últimos anos, em Portugal,em termos de qualificação e redução do abandono escolar: «Temos sido muito críticos em relação a distribuir diplomas porque isso não resolve os problemas do país. O que resolve é a formação", afirmou o Ministro da Educação à agência Lusa, no dia 13 de setembro de 2011.
Crato tem há dois meses, na sua posse, segundo o Expresso, o relatório que pode demonstrar a dimensão da sua estrutura moral. Que nos pode demonstrar se ele próprio alguma vez acreditou na sua parangona ideológica e se dispõe a aplicá-la coerentemente, ou não. É agora a vez de lutar contra o facilitismo. Estamos à espera!

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