sábado, 21 de janeiro de 2012

Diz que é uma espécie de revisão curricular

Sob o nome pomposo de revisão curricular o ministro da educação e ciência (mec) presenteou-nos com uma proposta de pequenas alterações sem fundamentação empírica válida e com uns laivos de justificação teórica inspirados num regresso à educação mínima (pomposamente ‘estrangeirada’ no sonante ‘back to basic’) que a senhora que me vende fruta no mercado do bairro, aplaude!
Uma revisão curricular digna do nome deve realizar-se na confluência de duas condições: primeira, uma clara identificação do que se entende por educação e das metas estruturais a alcançar; segunda, um conjunto de resultados empiricamente validados que demonstrem as insuficiências dos planos curriculares em vigor e que sustentem as alterações a efetuar. Não é o que se está a passar. Assistimos, ao invés, ao amadorismo e triunfo do senso comum mais rasteiro no discurso sobre educação.
A ‘revisão curricular’ é uma proposta opaca, na qual se não vislumbram as questões educativas (nem as de sempre, nem as do momento) e muito menos algum esboço de resposta consistente. Porque é que se propõe o desaparecimento de educação cívica quer no ensino básico, quer no secundário? A educação deixou de considerar a cidadania como uma das suas componentes essenciais? Ou prevê-se que outra(s) disciplina(s) desenvolvam este tipo de competências? Já não se pode dizer ‘competências’? Não se ensinam competências, mas somente conteúdos? Porquê? E como? Porque que se reduziram as disciplinas no 12º ano? Porque os alunos têm de se concentrar nos exames? Então porque não se reduzem no 11º ano, quando os alunos têm o mesmíssimo número de exames? Etc, etc., etc. … PORQUÊ?
Uma revisão curricular emerge da resposta a estes e outros ‘porquês’, caso seja digna desse nome. Não é o caso. Uma revisão curricular deveria ser um plano de melhoria, mas, já que se não alteram os fundamentos nem se justificam as opções, entendemos que, afinal, o ministro Crato não sabe, não pode ou não quer melhorar. Só ‘cortar’ dentro ‘do mesmo’– portanto, tornar mais pequeno e exíguo o lugar da educação pública de qualidade. Ou seja, piorar… Será mesmo essa a agenda?

2 comentários:

Anónimo disse...

Na verdade, Nuno Crato cometeu um erro, ou melhor, cometeu dois, a saber: designar como "reforma curricular" o que efectivamente não o é, o que revela falta de rigor linguístico; manter a atrocidade dos tempos de 90 minutos, o que revela ausência de perspectiva. Este segundo é mais grave, porque, ao contrário do primeiro, tem consequências. Quanto ao resto,estou como a senhora que vende fruta: em geral, aplaudo. A área de projecto deve ser intrínseca a cada disciplina ou área disciplinar, como caminho para a transformação do saber em competência (a competência é o saber em acção); o estudo acompanhado deve ser apenas para quem não consegue sozinho; a formação cívica, tal como a área de projecto deve ser inerente a toda e qualquer disciplina. Cada aula, seja do que for, deve ser um espaço de aprendizagem prática do que é a colaboração, o respeito, a urbanidade, a tolerância, a honestidade, o rigor, o esforço, etc., etc. Colocando estas áreas dentro das disciplinas (e não é preciso que um qualquer ministro o diga ou o mande) releva-se o carácter formativo do saber. Sim, porque o saber tem que ter consequências na formação do "eu" social e do "eu" ético. E, embora haja quem duvide de que ele, o saber, possa fazer as pessoas melhores, se a escola não aceitar isso como propósito, então pode fechar. Acho que a bola está na mão dos docentes.

Bjs.

Nelsa

m.f.f. disse...

Queridíssima Nelsa:
Em primeiro lugar, quero assinalar o prazer que é 'ouvi-la', mesmo à virtual distância que, porém, não me impede de reconhecer uma das vozes a quem mais devo...
Em segundo, registo que retirar A´rea de projeto, estudo acompanhado, etc, (com o que não discordo) e incluír estas dimensões educativas nas diferentes disciplinas... isso seria uma reforma curricular. Não foi assim. O que aconteceu foi um corte curricular.
Bj
FF