quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Sem voz

 
Sobre a discussão da revisão curricular, o blog 'a educação do meu umbigo' apresenta os resultados de uma sondagem elucidativa: as escolas, de forma esmagadora, não discutiram o assunto. Porquê? Talvez porque a democracia e a opinião esclarecida dê muito trabalho... 
Talvez porque a democracia esteja cada vez mais arredada do quotidiano escolar e é, assim, 'esquecida'...
Talvez sugestionadas pelas autocracias em vigor, promovidas pelo atual modelo de gestão, onde frequentemente os(as) diretores(as) estão mais preocupados em garantir as suas clientelas de sustentação e, concomitantemente, desencorajar o pensamento, a participação, a reflexão, tão incómoda.
Nas escolas que conhecemos, quem se preocupa com a revisão curricular? Que diretores(as) promovem a discussão destes assuntos e temas? E sobre as estruturas organizacionais e o equilíbrio interno dos poderes, alguém discute? Quem se preocupa com o direito dos alunos a uma educação de verdadeira qualidade?
A questão do currículo escolar, porém, não é de menor importância - nem se prende exclusivamente com o problema do desemprego docente (por relevante que seja), ao qual se resumem os comentários das 'salas de professores'. Hannah Arendt considerou a educação como um problema 'crítico' em si mesmo - e não somente enquanto 'crise' de modelos educativos e escolares. Dizia que se trata de um problema de amor; ela é o 'lugar' no qual se decide «se amamos suficientemente o mundo para nos responsabilizarmos por ele» e, mais especificamente, «se amamos suficientemente as nossas crianças para ... lhes darmos a oportunidade de realizar algo de novo, algo que nós [adultos] não havíamos previsto, de as prepararmos, hoje, para a missão de renovarem o mundo…» (Arendt, H. A crise da cultura).
Eu diria que o currículo é o núcleo das decisões ideológicas que alimentam o projeto educativo de cada nação. Por isso, é importante consciencializá-lo e refleti-lo.Mas as escolas, que seriam o lugar ‘natural’ destas discussões, não o fazem. Estão sem voz. É pena…

3 comentários:

São Almeirim disse...

Os nossos governantes não "amam suficientemente o mundo para se responsabilizarem por ele"! O egoísmo aliado à pobreza de espírito e de sensatez canaliza-lhes a "racionalidade" apenas para o pretenso lucro económico. Será que desconhecem que a riqueza de uma nação tem de se alicerçar num ensino de qualidade que requer verdadeiro investimento e ampla reflexão?

m.f.f. disse...

Concordo, São. Mas que fazemos nós, professores, para não merecermos tais governantes? O que se passa nas nossas escolas, o que preocupa as pessoas? O 'folclore' educativo. Como dizia um comentário que li no blog referenciado no meu 'post', as escolas «estão preocupadas em definir quem enche balões no dia dos namorados'. Acho um retrato lúcido e irónico. Mas lúcido. Basta ver o tipo de 'professor' que nos dão como modelo, a noção de 'excelência' que domina as escolas.
Bj
FF

L.Varela disse...

Cara autora do blog:
Encontro nos seus posts elevados motivos de reflexão.
Obg. continue a pensar e a escrever.