terça-feira, 6 de março de 2012

Alterações ao modelo de gestão e administração : a proposta da ambiguidade ou a democracia rarefeita (3)

Outra ‘novidade’ da alteração ao regime de administração e gestão das escolas públicas (DL 75/2008, de 22/4), prende-se com os departamentos curriculares e respetivos coordenadores. Assim:
- o número de departamentos curriculares passará a variar, de acordo com a realidade das escolas, que passarão a ter autonomia para o determinar (art.º 43º, ponto 3);
- os Coordenadores de departamento deixam de ser nomeados pelo Diretor, tout court, o qual passará a indicar 3 nomes, um dos quais será eleito  pelos docentes (art.º43º, ponto 5).
Estamos perante um fenómeno de hibridismo, quanto ao modelo de legitimação do cargo de Coordenador de departamento.
O DL 75/2008, ao estabelecer o princípio da nomeação, nestes cargos, consolidou a rutura com o padrão de legitimação democrática que se impôs após o 25 de abril de 74, e que constituiu o modelo estrutural e funcional do Conselho Pedagógico (CP); tal aconteceu, quer com regime de administração e gestão das escolas públicas definido pelo DL 769-A/76 (em vigor durante vinte e dois anos), quer com o definido pelo DL 115-A/98 (em vigor durante dez anos). A legitimação dos cargos de eleição encontra-se, precisamente, nos eleitores e acarreta a responsabilidade de representação democrática; durante trinta e dois anos anos os professores escolheram os seus representantes no CP e constituíram, em si mesmos, o garante de legitimidade do cargo. Isto significa que escolhiam (pelo menos, teoricamente) quem, de entre eles, assumia a responsabilidade de levar a sua voz e defender os seus interesses junto dos órgãos de poder e tomada de decisão. O Coordenador de Departamento representava os professores junto do CP e do órgão executivo.
O DL de 2008 inverteu esta lógica (como já vimos aqui e aqui), sem que muitos de nós nos apercebêssemos da dimensão de mudança efetiva de paradigma, que esta pequena reforma acarretava. Tornando-se cargo de nomeação, escolha direta do Diretor, este passou a constituir-se como garante efetivo de legitimação do mesmo, situação radicalizada, ainda, por dois aspetos não despiciendos: primeiro, pelo poder constante do Diretor de, em qualquer momento, exonerar e substituir ( o que inclui, naturalmente, situações de quebra de confiança) e, segundo, o facto do Diretor ser, por inerência, presidente do CP, o que, amplifica as dimensões do poder reunidas na sua  figura e contribui para alguma confusão entre as especificidades da gestão pedagógica e da administração escolar executiva.
Desta forma, desde 2008 que os professores deixaram de ter voz no CP, ao invés, passaram a ter, no respetivo Coordenador de departamento a voz (e, tantas vezes, os olhos…) do Diretor, em regime de proximidade! A inversão consolidou-se: o Coordenador de Departamento passou a ser, junto dos professores, o representante do Diretor.
E de acordo com o modelo agora proposto, quem representa o quê, junto de quem? O Coordenador de departamento passa instalar-se numa zona de legitimidade ambígua – em parte oriunda do Diretor (que o designou, com outros dois candidatos) e, em outra parte, derivada dos colegas que o elegeram (entre os três candidatos que só o foram, porque o Diretor os designou como tal…). Não é invejável, de facto, a posição dos futuros Coordenadores, assim lançados para uma terra de ninguém – ou, melhor, de ‘gente’ a mais, divididos na devoção a dois senhores!
Como contributo a uma inteligibilidade difícil, poderemos ainda aplicar a cadeia Aristotélica das causas e, sendo assim, a 'causa primeira' (a designação do Diretor) evidencia-se como fundamental e necessária, mas não como causa suficiente! E a causa eficiente, teria de ser necessária e suficiente. Estaremos, muito provavelmente, perante um problema de eficiência! Veremos.

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