
« ... o que eu pensei efectivamente foi que tudo era na realidade um pequeno equívoco sem solução que a vida levava consigo, de agora em diante os papéis estavam distribuídos e era impossível deixar de os desempenhar; (...) o simples facto de os ver representar os seus papéis era também um papel, e nisso consistia a minha culpa; fazer o meu papel porque a nada nos podemos furtar e todos somos culpados de qualquer coisa, cada um à sua maneira. E então invadiu-me um grande cansaço e uma espécie de vergonha, e ao mesmo tempo assaltou-me uma ideia que não fui capaz de decifrar, qualquer coisa a que poderia chamar o desejo de Simplificação. De repente, seguindo um novelo que se desenrolava a uma velocidade vertiginosa, compreendi que estávamos todos ali por causa de uma coisa que se chama Complicação, e que ao longo dos séculos, dos milénios, de milhões de anos, tem vindo a acumular, uns por cima dos outros, circuitos cada vez mais complexos, até formar aquilo que hoje somos e aquilo que vivemos. E senti a nostalgia da Simplificação (...)»
Antonio Tabucchi (1985) Pequenos Equívocos sem Importância
1 comentário:
Belíssima homenagem. Não conhecia esta obra de Tabucchi, mas parece-me de leitura obrigatória.
Lucas Varela
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