No Teatro Politeama, assistimos a mais
um musical de Filipe La Féria sobre a diva do fado. Desta vez, o autor e
encenador ficcionou um dos lendários serões de Amália, na sua casa da rua de
São Bento.
O cenário
reproduz a sala de estar da casa de Amália. Ao fundo, as janelas deixam
entrever o azul do céu, salpicado do branco das nuvens. É ainda neste espaço
que são projetados alguns dos quadros de Maluda, que retratam recantos da
cidade de Lisboa, através do recurso às novas tecnologias (projeção
multimédia).
O espetador, perante este “décor”,
sente-se como fazendo parte da história e do grupo de amigos de Amália
Rodrigues, durante uma noite de convívio, no dia 19 de dezembro de 1968, na véspera da partida de Vinícius de
Moraes para o Brasil.
Ao lado da figura central de Amália,
outras personagens desfilam, interagindo entre si. David Mourão-Ferreira, o poeta, acompanha Amália durante esta
noite. Os seus poemas foram cantados pela fadista, que aliás foi pioneira na
interpretação musical de poemas de autores consagrados. Alain Oulman, outro dos convivas, representa o artista, cuja
originalidade e forma de arte incomoda a repressão da ditadura salazarista,
sendo perseguido pela PIDE. Oulman acaba por decidir exilar-se em Paris, onde
crê poder continuar a dar asas ao seu talento de criação artística. Natália Correia simboliza a poesia de
elite, o poeta intelectual. Esta personagem contrapõe-se à de Ary dos Santos, que defende que a
poesia é do povo e para o povo. Esta perspetiva diferente fomenta a relação
aparentemente conflituosa entre ambos. A pintora Maluda completa esta galeria, simbolizando a importância das artes
plásticas no desenvolvimento intelectual e cultural de um povo. O elenco das
personagens conta ainda com o poeta e cantor Vinícius de Moraes, os acompanhantes musicais de Amália (guitarra
portuguesa e viola) e Hugo Ribeiro, funcionário da Valentim de Carvalho e
responsável pela gravação dos fados e das declamações feitas pelos diferentes
intervenientes, durante este longo serão cultural. Para completar este quadro,
surge ainda Casimira, a empregada e governanta de Amália.
A ação decorre durante uma noite,
assistindo-se a uma reprodução mais ou menos fiel do convívio entre artistas de
diversas áreas (música, pintura e poesia) na casa da diva portuguesa do fado.
Para além da partilha das expressões de arte que cada personagem domina, o
objetivo deste serão é o de que todas as representações sejam gravadas para
editar um disco, pela Valentim de Carvalho.
Quanto à personagem principal, o
público fica a conhecer as suas diferentes facetas: a Amália que canta fado (e
cujas letras são poemas de Camões, David Mourão-Ferreira ou Ary dos Santos); a
Amália que interpreta cantigas com uma sonoridade mais popular; a Amália que
canta canções em línguas estrangeiras como o Francês ou o Espanhol.
O público vai, assim, construindo um
retrato desta artista, ficando com a ideia de que esta foi muito mais do que
uma fadista, adaptando-se com extrema facilidade a outros registos musicais.
Por último, o espetador é brindado com
uma homenagem feita por cada ator a cada um dos artistas retratados,
evidenciando a mais-valia que cada um deles representou no contexto da época
recriada.
“Uma
noite em casa de Amália” presenteia o público com a evocação de figuras
incontornáveis da cultura portuguesa.
Amália
ofereceu-nos a sua VOZ… Para sempre!
21/01/2013